Transgressão

Jerek Kubicki
Só há mulher na descontornar. De uma linha invisível, um limite ideal, um destino de carne, a que se pode decidir, nunca conscientemente, adequar-se ou desafiar. Há mulheres gordas, cheias de substância - pele, gordura, músculo, osso, sangue - que não parecem transgredir o espaço, esse é seu traçado, essa linha alguém traçou em seu lugar, no início dos tempos, neste século, ou desde a primeira explosão estelar.
Há mulheres, outras, muito magras, que se rebelaram e, com coragem, descolaram-se de qualquer determinação sobrenatural ou genética que as submetem a ocupar espaços sufocantes, os quais não querem adentrar. São intrigantes, pois transparecem a falta, algo que escapa, deveriam ter mais; mais ombros, mais coxas, menos nariz, dedos mais longos. São aquém.
Há mulheres imensas, com bundas grandes, barrigas salientes, peitos enormes, que claramente desafiam uma herança genética, uma família invisível, a cultura da fome. Fascinam pela propriedade com que caminham, pela voz que ressoa em toda essa carne em excesso, pelo esforço que fazem para ser além.
É muito difícil determinar a transgressão. Talvez não seja absoluta. Não está no transbordar, no espaço que dilaceram com seus corpos, mas na sua decisão de se afastar, com muita dor e contorções, desse traçado feito por um artista indiferente a qualquer desejo de mulher, a qualquer noção de brincadeira a qualquer vislumbre de um abismo. Além e aquém de qualquer entendimento.

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